A pobreza em Portugal

A pobreza em Portugal
Uma dura realidade
No final da passada semana veio o Instituto Nacional de Estatísticas comprovar aquilo que quem vive no mundo real já sabia: a pobreza em Portugal está a aumentar sobretudo entre as crianças e entre os idosos.
Num país da União Europeia, em pleno século XXI, um país ter 35% da população em risco de pobreza, privação material ou ambos, e um quarto dos idosos com dificuldades económicas, constitui uma vergonha e uma prova do fracasso das políticas de sucessivos governos.
Fica demonstrado que na ânsia de aplicar medidas de austeridade as principais vítimas foram os socialmente mais vulneráveis que não foram protegidos pelo Estado. Não houve equidade na distribuição dos sacrifícios e como nestas coisas a tradição ainda é o que era, foi mais uma vez o “mexilhão quem se lixou”.
Dirão os cegos defensores das políticas de austeridade: não cortámos os ordenados mais baixos. É verdade que não o fizeram, mas promoveram os despedimentos e a precariedade, cortaram nas horas extraordinárias (que para muitos era única forma de equilibrarem os rendimentos), aumentaram os custos com a alimentação, luz, água, habitação e energia, dificultaram o acesso à educação, saúde e justiça, a par de mais uma série de medidas que contribuíram de forma objectiva, consciente e deliberada para o aumento dos níveis de pobreza existentes em Portugal já antes da entrada em cena da malfadada Troika.
Esta tinha por único objectivo servir os mercados aplicando programas feitos em gabinete sem o mínimo de noção da realidade ou preocupação pelas consequências. Experimentalismo económico e social e defesa intransigente dos superiores interesses dos mercados ditaram que os países intervencionados caminhassem para um cenário de desastre social e económico, que não só não resolveu nada (por não se tocar nas causas da crise) como contribuiu para os pobres ficarem mais pobres e os ricos ficarem mais ricos.
O período de campanha eleitoral não justifica o permanente estado de negação notoriamente visível nas intervenções públicas dos governantes deste país e nas interesseiras declarações de agências de rating (bem merecedoras de uma investigação séria e independente sobre as ligações a fundos de investimento e similares) e políticos estrangeiros cujos países têm bem lucrado nos últimos anos (e para quem solidariedade europeia é uma expressão vã).
Se mais não fosse, a proliferação de projectos de apoio alimentar (cantinas sociais, bancos alimentares, refood e outros promovidos por IPSS's e paróquias como apoio diários e/ ou mensais) são bem demonstrativos do agravar da situação económica e social de uma crescente franja da nossa população.
Todos os que vivemos no Portugal real conhecemos inúmeras pessoas que dependem de apoio alimentar, não conseguem pagar regularmente a água, luz, gás ou renda de casa, abdicam de comprar medicamentos ou ir ao médico e vivem em habitações sem o mínimo de condições e, nalguns casos, mesmo aproveitando as ruínas de imóveis abandonados.
Varrer os desempregados para debaixo do tapete para apresentar números mais simpáticos não resolve coisa nenhuma. Esconde a realidade e serve de pretexto para dizer que estão a ter sucesso os programas que na prática estão a fracassar.
Estar em formação, ser CEI ou estagiário, ou pura e simplesmente ter saído das estatísticas oficiais por desistir de procurar emprego, não corresponde a diminuição do desemprego. Emigrar, ter empregos precários e mal remunerados, quando não mesmo subemprego, não é diminuir o desemprego.
A pobreza não se mede apenas por quem recebe apoios da Segurança Social – há quem seja excluído e receba apoio de paróquias ou grupos de voluntários.
A grande carência de habitação social provocada pelo aprofundamento do desajustamento económico nos últimos anos, não tem resposta em termos oficiais.
O elevado número de situações de pessoas e famílias em carência continuada não tem resposta em termos oficiais. Desde que se consiga esconder, e não morra ninguém de fome, podemos sempre dizer que não é real a realidade que todos conhecemos.
Urge mudar de políticas e recentrar as mesmas no beneficio das pessoas e nas famílias, no bem comum.
Negar esta realidade só demonstra que quem o faz ou desconhece o que se passa no mundo real (o que é grave) ou conhece mas não quer saber (o que é ainda mais grave).
E isto vai piorar – não há vontade de mudar de políticas e daqui por vinte anos vamos ter muitos milhares de pessoas a chegar à terceira idade totalmente desprotegida, sem poupanças, sem reforma (porque ou nunca trabalhou ou os descontos são muito baixos) e sem ter a quem recorrer. Nessa altura é que vamos ver a verdadeira dimensão das desastrosas políticas seguidas.
E em boa verdade todos sabemos que isto é verdade, só que os superiores interesses dos mercados sobrepõem-se ao bem geral da humanidade.
Os números publicados pelo Instituto Nacional de Estatísticas são uma vergonha para qualquer país. Conseguirão os nossos governantes dormir descansados perante este cenário? Desde que Wall Street esteja satisfeita para eles tudo está bem.

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