1.
Tendo em conta que a proposta de suspensão dos direitos políticos
partiu da Alemanha e mereceu a adesão inicial da França, é
possivel considerá-la como ilustrativa de uma hierarquia de poderes
na política internacional em que o eixo franco-alemão teria uma
especial preponderância na política europeia? Justifique.
Na
sequência dos horrores que marcaram a Europa e o Mundo na primeira
metade do século XX, com o decurso da 1.ª e 2.ª Guerras Mundiais,
os Estados compreenderam a necessidade da existência de fóruns
internacionais onde todos tivessem voz e onde se pudessem dirimir, de
forma pacífica, os conflitos emergentes entre os diversos membros e
existia o oibjectivo de em simultâneo constituírem pólos de
desenvolvimento comum numa sociedade a caminho da globalização e
facilitar um acesso cada vez mais rápido à informação. Com estas
instituições supracionais abrir-se-iam os mercados transnacionais,
facilitando a troca de bens, conhecimentos e experiências, o que
potenciaria o caminho para a existência de uma comunidade
internacional, agregadora das diversas culturas, línguas e
histórias.
A
existência desta comunidade internacional pressupõe que todos os
Estados trabalhem para o bem comum da humanidade, no pressuposto do
respeito pelas especificidades culturais, sociais e lingíisticas de
cada um e de um desenvolvimento generalizado subordinado ao
normativismo internacional estabelecido e regulado por um poder
supranacional
Contudo,
séculos de divergências e conflitos, criam dificuldades acrescidas
à prossecução destes objectivos, mantendo a vincada influência
das soberanias nacionais e fragilizando o poder supranacional.
Estas
divergências não permitiram que fosse possivel encontrar o passo
certo para que todos os Estados pudessem desenvolver-se de forma
igualitária.
Assim,
enquanto que os Estados economicamente mais frágeis se tornam mais
susceptíveis de sofrer as consequências das crises dos mercados
internacionais, os Estados mais fortes economicamente e
historicamente habituados a influenciar os destinos Europeus, temendo
serem atingidos pelos efeitos colaterais das crises que atingem os
mais vulneráveis, reagem procurando impor os seus interesses.
Alemanha
e França são dois dos Estados que pela influência sempre procurarm
exercer poder sobre os destinos da história Europeia, ainda que
frequentemente de costas voltadas.
No
caso actual da crise das divídas públicas que afecta Portugal,
Irlanda, Grécia e Espanha, estes dois Estados do centro da Europa,
procuram unir as respectivas forças na defesa dos respectivos
interesses soberanos ameaçados de contágio por força da
globalização da economia e por todos pertencerem à Zona Euro,
partilhando um sistema monetário comum com os beneficios e riscos
daí inerentes face às diferentes realidades.
Assim,
o eixo franco-alemão procura impor-se aos restantes Estados enquanto
potências económicas, numa tentativa de hierarquização dos
Estados, impondo já não pela força das armas, mas sim através das
regras do Direito Internacional a preponderância dos seus interesses
e da sua vontade, visíveis na influência exercida na nomeação do
Presidente da Comissão Europeia e dos responsáveis do Banco Central
Europeu, bem como pela influência exercida no Parlamento Europeu
através do número de mandatos que em conjunto detêm.
Esta
procura de hierarquização marca mais uma etapa da divergência
entre o racionalismo da tradição maquiavélica e a justiça da
tradição humanista, revelando a dificuldade em superar o pluralismo
de poderes em prol de uma maior solidariedade internacional.
O
Tratado da União apenas prevê a suspensão dos direitos de voto de
um Estado em casos de existência de um risco manifesto de violação
grave de algum dos princípios da liberdade, da democracia, do
respeito pelos direitos do Homem e pelas liberdades fundamentais, bem
como do Estado de Direito.
Naturalmente
a suspensão dos direitos políticos dos Estados incumpridores
desagrada aos países que potencialmente se possam encontrar nessa
situação e que veriam assim o seu papel na União Europeia limitado
e colocando-se em posição hierárquicamente inferior à França e
Alemanha, pelo que se opõem à alteração das regras do Tratado da
União que viessem a permitir tal situação.
Por
força desta tentativa de hierarquização, pode-se falar numa Europa
a duas velocidades, o que poderia ser amplificado com esta intenção
de suspensão dos direitos políticos de um Estado por motivos de
incumprimento orçamental.
2.
A sujeição dos Estados membros a sanções pelo não cumprimento de
determinadas normas de gestão orçamental não configura uma grave
interferência na respectiva soberania? Justifique.
Uma
Nação é constítuida por um povo, com uma língua comum, um
património de tradições e costumes, reconhecendo interesses comuns
e a necessidade de uma soberania própria.
Esta
soberania vinca-se nomeadamente pela existência de leis que regem o
funcionamento da sociedade de um Estado em todos os seus vectores –
sociais, culturais, políticos e económicos, esabelecendo as suas
próprias estratégias de desenvolvimento.
Ao
aceitarem livremente integrarem-se em instituições supranacionais
que visam a prossecução de políticas comuns e com o aprofundamento
dessa integração, através dos sucessivos desenvolvimentos que ao
longo das últimas cinco décadas a União foi vivendo com a
aprovação de Tratados cada vez abrangentes, os Estados abdicaram de
alguma dessa soberania em favor das instituições da União
Europeia.
É
natural e normal que em qualquer nível da sociedade em que nos
integremos haja regras a cumprir e sanções para quem não as
cumpre.
Quando
um Estado soberano aceita integrar-se numa instituição supracional
que visa o aprofundamento de políticas comuns numa multiplicidade de
áreas, partilha um sistema monetário comum e inclusivamente aceita
a fiscalização prévia dos orçamentos nacionais pela União
Europeia, tem a noção de que existem regras a ser cumpridas e que
ao não o serem irão afectar todos os Estados membros dessa
comunidade.
Neste
sentido é perfeitamente natural que os Estados estejam sujeitos a
sanções pelo incumprimento das regras que aceitaram e aprovaram,
não podendo essa situação ser vista como uma grave interferência
na respectiva soberania já que abdicaram de parte dela em prol de
uma politica económica comum, podendo apenas eventualmente
questionar-se a natureza e gravidade das sanções a aplicar pelo
incumprimento das regras, que é o que sucede no caso vertente da
intenção de retirar os direitos de voto a um Estado-membro da Zona
Euro.
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